VEREADOR É CONDENADO POR FRAUDE EM DOCUMENTOS PÚBLICOS EM SÃO LOURENÇO


LEIA O PROCESSO NA ÍNTEGRA

L.C.S, identificado e qualificado nos autos, foi denunciado e está sendo processado como incurso nas penas do art.89 da Lei nº8.666/93, art.297, §1º, e art.299, parágrafo único, ambos do Código Penal, porque, segundo a denúncia, no ano de 2014, quando Presidente da Câmara Municipal, iniciou procedimento administrativo licitatório destinado a contratar empresa de consultoria técnica para elaboração do edital do procedimento licitatório que seria levado a cabo para realização das obras de reforma do imóvel que abriga a Casa Legislativa. Aduz a denúncia que o referido procedimento chegou à fase final em 30/04/14, quando se publicou no São Lourenço Jornal termo de ratificação de dispensa de licitação, findando o procedimento. No entanto, prosseguiu o Dr. Promotor, graves irregularidades macularam o procedimento administrativo e indicaram que houve fraude documental, ideológica e não observância dos procedimentos necessários à dispensa da licitação. Sustenta que, muito embora conste do referido procedimento administrativo que a Comissão Permanente de Licitação da Câmara Municipal, regularmente nomeada pela Portaria nº17/2014, foi a responsável pela condução dos atos administrativos que desencadearam na conclusão de que seria pertinente a contratação por dispensa de licitação, o fato é que os membros da referida comissão somente tomaram conhecimento da tramitação do procedimento em 27/03/14. 

Segundo a denúncia, o réu, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal, e no intento de direcionar a contratação da empresa S & L Consultoria Administrativa e Atividades Educacionais Ltda., produziu intelectual e materialmente todos os documentos, cujas autorias foram atribuídas aos membros da Comissão Permanente de Licitação e ao assessor jurídico da Câmara Municipal. Diz a denúncia que o réu montou fraudulentamente, do início ao fim, todo o procedimento administrativo que culminaria com a contratação da referida empresa, apresentando-o, em seguida, aos membros da Comissão Permanente de Licitação. Ocorre que, segundo a inicial, o presidente da Comissão Permanente de Licitação, percebendo a ilegalidade e não concordando com a conduta praticada pelo réu, se reuniu com os demais membros e, juntos, consignaram na ata de f.12 os atos fraudulentos praticados, corporificando os fatos expostos, a saber, e em resumo, “Todo o processo já chegou à Comissão de Licitação pronto, sem a comissão nunca ter solicitado, elaborado e aprovado alguma parte do mesmo...”. Aduziu, assim, a denúncia, que a Comissão Permanente de Licitação, além de não conduzir o procedimento, não foi a autora intelectual e material da ata de fls.61/62, onde consta que os membros da comissão concluíram pela dispensa de licitação, com a seguinte redação: “... Esta CPL se debruçou no douto parecer jurídico e também abraça a indicação feita, qual seja, a DISPENSA DE LICITAÇÃO...”. O réu se utilizou deste documento, não assinado pelos supostos autores, para ratificar a dispensa de licitação, sendo certo que o ato foi publicado no jornal local tornando-se válido para todos os efeitos. Diz a denúncia, neste ponto, que o contrato foi devidamente assinado somente pelo réu, demonstrando a fraude. A denúncia ainda sustenta que o parecer jurídico atribuído ao assessor jurídico da Câmara Municipal, Daniel Gicovate, e que embasava todo o procedimento, não foi por ele elaborado, tanto que o advogado, ao tomar conhecimento do teor do documento (cópia às fls.55/57), recusou-se a firmá-lo e cuidou de escrever em seu corpo o adjetivo “NULO”. Por fim, a denúncia frisa que todo o procedimento administrativo licitatório foi produzido e literalmente montado pelo acusado, sem a participação da Comissão Permanente de Licitação e da assessoria jurídica, com a clara intenção de se dispensar a licitação e se contratar a empresa S & L Consultoria Administrativa e Atividades Educacionais Ltda. Concluiu pedindo a condenação do acusado nas penas do art.89 da Lei nº8.666/93, art.297, §1º, e art.299, parágrafo único, ambos do Código Penal.

A exordial veio instruída com o Inquérito Civil Público de fls.07/170.

Recebida a denúncia (fls.173/175), o acusado foi devidamente citado (fls.176/177), tendo apresentado, tempestivamente, resposta escrita (fls.178/192).

Em sua resposta escrita, resumidamente, o réu arguiu preliminar de nulidade da denúncia por ter sido baseada em inquérito civil público dirigido pelo mesmo órgão deflagrador da ação penal e nulidade do inquérito policial, que teria infringido o contraditório e a ampla defesa. No mérito, sustentou a impossibilidade de punição de meros atos preparatórios, já que, ainda que presente alguma intenção de se fraudar um certame, a mesma não trespassou a fase de mera cogitação, vez que sequer houve homologação, tampouco a adjudicação do processo licitatório, restando o mesmo absolutamente invalidado, e, dessa forma, sem qualquer relevância no mundo jurídico. Sustentou, outrossim, e por fim, ausência de ilegalidade por parte do réu em todo o processo licitatório (fls.178/192).

Sobre a defesa prévia (ou resposta escrita) manifestou-se o Ministério Público às fls.194/200.

Às fls.201/202 decisão ratificando o recebimento da denúncia, após rejeitar as preliminares e o pedido de absolvição sumária, não se insurgindo o acusado, por qualquer meio ou forma, desta decisão.

A instrução criminal consistiu na oitiva de oito testemunhas (fls.224/234, 277/278 e 288) e no interrogatório do réu (fls.318/320).

Em alegações finais, o Ministério Público, após analisar os autos, a prova coligida e o direito aplicável à espécie, pugnou pela condenação do acusado como incurso nas penas do art.297, §1°, do CP, e art.89 da Lei 8.666/93 (fls.361/372).

A Defesa, em alegações finais, apresentou preliminares de nulidade do feito alegando ausência de justa causa para a ação penal e inépcia da inicial. No mérito, alegou inconstitucionalidade da 2° parte do art.89 da Lei de Licitações sob argumento de que não tutela nenhum bem jurídico e sim uma mera função de controle da administração pública. Requereu, também, a absolvição ante a inexistência dos fatos narrados na denúncia e da atipicidade dos fatos historiados. Pugnou, por fim, a absolvição quanto ao delito de falsificação de documento público posto ausente a materialidade delitiva (fls.373/390).

CAC, às fls.358/360.

Anote-se que houve juntada de documentos, pelo réu, quando das alegações finais (fls.391/515), razão pela qual, em diligência, foi dada vista ao ministério público (f.515vº), e, diante da manifestação deste (f.517), nova vista à defesa (f.517vº), permitindo-lhe ‘falar por último’, o que realmente fez (fls.519/521), com a subsequente CLS dos autos para decisão (f.521vº).

RELATADOS, em síntese do necessário,

FUNDAMENTO e DECIDO.

DAS PRELIMINARES

Da preliminar de ausência de justa causa para a ação penal

Pondero que tal tese da defesa já foi devidamente refutada na oportunidade do despacho de recebimento da denúncia (fls.173/175) onde restou consignado que a inicial acusatória veio acompanhada de provas suficientes a dar prosseguimento à ação penal, sustentando perfeitamente a combatida ‘falta de justa causa’.

Mesmo considerando as razões invocadas pela defesa, neste novo momento, não há qualquer motivo para o reconhecimento de falta de justa causa, seja pelas razões já expostas anteriormente, seja porque o processo já está pronto para julgamento, com a instrução encerrada.

Dessa forma, afasto a primeira preliminar invocada pelo nobre causídico.

Da preliminar de inépcia da inicial

No que tange a preliminar de inépcia da inicial, tenho que essa questão também já foi decidida nos autos (Cf.fls.201/202), sendo à época refutada tal hipótese considerando que a denúncia, mesmo que sucintamente, descreveu os fatos apontados como crime de forma a ser possível o exercício do contraditório, e tanto isso é verdade que a ampla defesa, presente o devido processo legal, se deu naturalmente, sem qualquer prejuízo para a parte.

Pondero que a decisão de fls.201/202 passa a fazer parte integrante dessa sentença, neste momento, para refutar a segunda preliminar invocada pela Defesa.

Da contradita à testemunha apresentada à fl.222

A defesa, quando da realização da primeira audiência para colheita de prova oral, contraditou a testemunha Daniel Gicovate (depoimento de fls.227/228), alegando, em síntese, inimizade entre a testemunha e o acusado L.C.S.

Contudo, percebe-se pelo termo de fls.227/228 que a referida testemunha não foi contraditada no momento oportuno.

Ora, a contradita, como é cediço e está expresso no art.214 do CPP, deve ser arguida antes de iniciado o depoimento, quando da qualificação da testemunha. Se a defesa deixou para contraditar a testemunha somente no final do depoimento, o fez de forma inoportuna, como bem ponderou o Promotor de Justiça, daí o seu indeferimento. Na ocasião, o juiz ponderou que, quando da análise do depoimento da referida testemunha, o faria com todo o rigor, o que será feito abaixo.

Do requerimento de dispensa da testemunha de fl.316

A defesa, à fl.316, requereu a dispensa da testemunha Sidney Martins de Paiva.

Esse requerimento, por um lapso, não foi apreciado no momento de sua juntada aos autos.
Contudo, conforme se vê de fl.313, houve a designação do interrogatório do réu, ato que, como meio de defesa que é, só pode ser realizado após o encerramento da instrução processual.

Dessa forma, tenho que, implicitamente, o requerimento de fl.312 restou deferido, em atendimento à pretensão da parte, não restando assim, com certeza, qualquer pendência que impeça o julgamento do feito.

DO MÉRITO

No mérito, a denúncia é parcialmente procedente.

Segundo sustenta a acusação, o réu, no ano de 2014, quando Presidente da Câmara Municipal, iniciou procedimento administrativo licitatório destinado a contratar empresa de consultoria técnica para elaboração do edital que seria levado a cabo para a realização do projeto das obras do imóvel que abriga a Casa Legislativa, chegando o procedimento a sua fase final em 30/04/14, quando foi publicado no São Lourenço Jornal termo de ratificação de dispensa de licitação. No entanto, segundo o Ministério Público, várias irregularidades macularam o procedimento administrativo e indicaram fraude documental, ideológica e a não observância dos procedimentos necessários para a dispensa de licitação. Consta, ainda, da denúncia, que todo o procedimento licitatório foi produzido e montado pelo acusado, e não pela Comissão Permanente da Licitação, o que seria correto e legal, constatando-se, ademais, que os documentos não foram assinados e nem manufaturados pela citada Comissão, muito menos com a anuência do assessor jurídico da Câmara Municipal.

Eis uma síntese dos fatos, sublinhando-se os mais relevantes.
Pois bem.

A denúncia é parcialmente procedente na medida em que, ao meu sentir, depois de examinada toda a prova reunida, o acusado deverá ser absolvido do crime descrito no art.89 da Lei nº8.666/93, mas condenado por infração ao art.297, §1º, do Código Penal, vale dizer, por falsificação de documento público.

Antes de analisar questões de direito, indispensável examinar a prova produzida, documental e testemunhal.

Vejamos.

Da prova documental produzida durante o Inquérito Civil

Às fls.10/11, verifica-se a existência de uma denúncia apócrifa anunciando que a Câmara Municipal direcionou licitação destinada à contratação de serviços técnicos de consultoria para preparação de edital licitatório destinado a contratar empresa de engenharia para realizar obras de reforma do prédio da Câmara Municipal.

A Ata da Comissão de Licitação, de f.12, assinada pelo Presidente da Comissão, membros e relator, dá conta, em resumo, de que “Todo o processo já chegou à Comissão de Licitação pronto, sem a comissão nunca ter solicitado, elaborado e aprovado alguma parte do mesmo”. E prossegue que “O termo de ratificação será publicado no Jornal São Lourenço do dia 30/03/2014 já que foi solicitado pelo Presidente da Câmara”. Ainda, aduz que “A Comissão de Licitação vem através deste registrar que não teve nenhuma participação no referido processo, que tudo partiu da figura do Presidente da Câmara e a Comissão de Licitação não assinará nada com relação a esse processo”.

À f.13, cópia de Portaria do Presidente da Câmara Municipal nomeando servidores do Quadro Permanente para comporem a Comissão Permanente de Licitação, destacando-se o inciso II que “A referida Comissão procederá os seus trabalhos segundo os critérios da Lei Federal nº8.666/93 e posteriores alterações”, vale dizer, caberia à referida Comissão todo o trabalho pertinente à licitação destinada à contratação de serviços técnicos de consultoria para preparação de edital licitatório destinado a contratar empresa de engenharia para realizar obras de reforma do prédio da Câmara Municipal, e não ao Presidente réu, como acabou acontecendo por iniciativa dele.

Subsequentemente, outras Portarias foram editadas nomeando outros membros da Comissão Permanente de Licitação (fls.13/16), que passaram a ter competência para o processo licitatório, o que fugia da alçada do Presidente da Câmara, ora réu, já que Comissão de Licitação era a competente para este fim.

Às fls.17/19 cópia de ofícios, sem assinatura, mas com o nome do Presidente da Câmara, ora réu, solicitando de empresas propostas de preços para executar serviços técnicos de consultoria de edital licitatório para contratar empresa de engenharia para executar obras de reformas do prédio da Câmara.

S & L Consultoria Administrativa e Atividades Educacionais Ltda, acusada de se beneficiar do referido procedimento licitatório, apresentou os documentos de fls.20/49.

Às fls.49/52, documentos em tese produzidos pela Comissão Permanente de Licitação sem a assinatura de qualquer membro, o que vai ao encontro do teor da Ata de f.12, já analisada acima.

A Certidão de f.53 está assinada apenas pelo réu, e o mesmo se diga com relação à Autorização de f.54, o que também confirma a alegação de que foi ele o autor intelectual e material do procedimento licitatório em questão.

O Parecer Jurídico de fls.55/57, dado como da autoria do Assessor Jurídico da Câmara, sem a sua assinatura, foi inutilizado por este que nele apôs a palavra “NULO”, já que inconformado com o que viu e não produziu, tratando-se de documento produzido por terceiros e a ele encaminhado apenas para coleta de assinatura, com o que ele não concordou.

Uma Minuta Contratual foi juntada às fls.58/60, sem assinaturas, a demonstrar, também, que os membros da Comissão Permanente de Licitação não atuaram na confecção de tal documento.

A Comissão Permanente de Licitação combateu duramente o documento de fls.61/62, denominado de “Reunião Extraordinária” – “Comissão de Licitação” -, sem assinatura de qualquer membro, embora conste o nome de dois deles, os Srs. Afonso Raimundo da Silva e Rommel Junqueira Fernandes.

Extrato para publicação do Termo de Ratificação de Dispensa de Licitação, à f.63, que acabou sendo efetivamente publicado, como se vê de f.176, a corroborar as “reclamações” feitas pelos membros da Comissão Permanente de Licitação e que é parte integrante do histórico da denúncia.

O Termo de Ratificação de Dispensa de Licitação foi assinado pelo Presidente da Câmara, ora réu, sem a participação de qualquer membro da Comissão Permanente de Licitação (Cf.f.64).

O Contrato Administrativo de Prestação de Serviços, sem nº, tendo como empresa contratada S & L Consultoria Administrativa e Atividades Educacionais Ltda, de fls.65/72, leva a assinatura apenas do acusado e de nenhum membro da Comissão Permanente de Licitação.

Durante o Inquérito Civil os membros da Comissão Permanente de Licitação prestaram depoimentos, e, todos eles confirmaram os fatos historiados na denúncia, como se vê de fls.81/82, 84/87 e 91/93. Análise mais amiudada dos depoimentos será feita abaixo, quando da análise da prova oral.

Da prova oral produzida em juízo

De início, verifica-se que a testemunha Afonso, ao prestar declarações em juízo, relatou que fazia parte da comissão de licitação na época dos fatos e que o processo licitatório feito pelo réu não se processou regularmente perante a comissão. Acrescentou que a ata elaborada pela comissão é aquela que se encontra à fl.12 dos autos e que não produziu a certidão de fl.53. Disse que, muito embora conste seu nome como secretário-executivo, não assinou documento algum do procedimento licitatório, porque quando o processo chegou às suas mãos já estava pronto e acabado (fls.224/225).

No mesmo sentido o depoimento prestado pela testemunha João Bosco. Tal testemunha afirmou, inicialmente, que fazia parte da comissão permanente de licitação, porém, não participou, efetivamente, do processo licitatórionão tomando conhecimento de qualquer procedimento produzido. Relatou que, até o momento da reunião da ata de fl.12, a comissão não havia sido convocada para participar do processo de licitação (fl.226).
A testemunha Rommel esclareceu que também fazia parte da comissão de licitação à época dos fatos e que o processo licitatório produzido pelo acusado chegou pronto para os membros da comissão assinarem (fls.229/230).

Daniel Gicovate (testemunha contraditada de forma inoportuna, como anunciado supra), que à época do ocorrido era assessor jurídico da Câmara, disse que o procedimento licitatório objeto da denúncianão ocorreu dentro das normas legais. Disse, ainda, não ter confeccionado o documento de fls.55/57, bem como acrescentou que, ao tomar conhecimento desse parecer, escreveu a palavra “NULO”. Contou, por fim, que a citada licitação chegou ao final e, inclusive, foi publicada, mas que depois foi revogada (fls.227/228). Importante ponderar neste momento, que não vejo ‘senão’ ou qualquer declaração ‘tendenciosa’, ‘parcial’ ou ‘facciosa’ feita por esta testemunha (contraditada fora do momento oportuno, ao final do depoimento). Suas declarações estão em harmonia com os demais depoimentos produzidos, com isso, sem razão a contradita e o depoimento deve ser aceito normalmente, como os demais. Aqui, a alegação de inimizade da DD Defesa não maculou o ato, porquanto coincidente e em concordância com os demais depoimentos, repete-se.

Ana Carolina, também membro da comissão de licitação, confirmou que não assinou o processo licitatório porque não participou da produção da maioria dos documentos nele juntados. Disse, ainda, que foi o réu quem lhe solicitou a remessa do extrato do termo de dispensa de licitação para o São Lourenço Jornal para que fosse publicado (fl.231).

A testemunha Renato, atualmente membro da comissão de licitação, esclareceu que havendo necessidade de se adquirir certo serviço ou bem, o presidente da comissão encaminha requerimento para o Presidente da Câmara e este autoriza a realização da licitação. Disse que, após a autorização do Presidente da Câmara, o processo licitatório é sempre aberto pelo presidente da comissão de licitação (fl.234). Anote-se, desde já, que isso é o que deveria ter sido feito e não foi na hipótese dos autos.
Por fim, o acusado, ao ser interrogado, negou ter produzido e montado o procedimento licitatório sem a participação da comissão permanente de licitação e da assessoria jurídica. Disse que sua participação foi apenas de determinar a formação da comissão de licitação e no final assinar a documentação produzida. Acrescentou, por fim que, durante o processo revogou a licitação porque decidiu nomear outra comissão mais capacitada (fls.319/320).

Essa a prova oral reunida.

Da análise dos fatos comprovados à luz da legislação citada na denúncia e demais regras de Direito, inclusive Jurisprudência reinante

Pelo que se vê da prova coligida, documental e testemunhal, a exordial acusatória narra que o acusado, à época dos fatos Presidente da Câmara Municipal, iniciou um procedimento licitatório com o intuito de contratar a empresa que elaboraria o edital para licitar a reforma do prédio da Câmara, mas que não realizou o procedimento conforme determina a Lei de Licitações (Lei n°8.666/93) e, ainda, falsificou uma série de documentos públicos para conseguir realizar o processo licitatório.

Quanto às supostas irregularidades no procedimento licitatório que levaram o Ministério Público a denunciar o acusado no delito do art.89 da Lei nº8.666/93, é certo que o citado diploma legal visa punir quem deixa de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou a exigibilidade de licitação e busca proteger bens jurídicos, além do patrimônio público e o direito dos licitantes ao procedimento previsto em lei, isto é, pune aquele que dispensa o procedimento licitatório fora das hipóteses previstas no art.24 da Lei nº8.666/93 e aquele que não respeita as formalidades exigidas.

Conforme se extrai de toda prova produzida, nenhuma dúvida, mínima que seja, de que o denunciado não respeitou as formalidades legais previstas na Lei de Licitações.

Porém, o delito tipificado no art.89 da Lei supracitada exige dolo específico de lesar o patrimônio público, tratando-se de crime material, somente punível quando da ocorrência de resultado naturalístico, no caso, dano ao patrimônio público.

Pelo que se vê do documento de fl.119, o réu, enquanto Presidente da Câmara Municipal, ao perceber as irregularidades e ilegalidades cometidas, revogou o procedimento licitatório. Dessa forma, o contrato com a empresa não foi concretizado não tendo saído dos cofres públicos nenhum tipo de pagamento.

Essa circunstância foi bem ponderada pela DD Defesa em suas alegações finais e me inclino a reconhecer que a consumação do crime do art.89 da Lei nº8.666/93 se dá com a assinatura do contrato administrativo e evidente prejuízo ao erário público, o que não ocorreu na hipótese presente.

Em busca de pesquisa jurisprudencial sobre o tema, verifiquei a falta de consenso. O STJ já decidiu, em dois processos de relatoria do então Ministro Luiz Fux (então Ministro do STJ), que o delito do art. 89 da Lei nº8.666/93 só seria punível quando produzisse resultado danoso ao erário (APN 214/SP, julgado em 07/05/2008, e APN 226/SP, julgado em 1º/08/2007).

Em outras oportunidades, o mesmo STJ sustentou que o referido delito se perfaz com a simples conduta de afastar a regra para a realização do procedimento licitatório, sendo, portanto, crime de mera conduta que não exige dolo específico ou resultado naturalístico (HC 139.946/PR, julgado em 08/11/2011 e REesp 991.880/RS)

Por fim, o mesmo STJ, em reunião de sua Corte Especial, na oportunidade de julgamento da APn 480/MG, veio a considerar que o crime previsto no art.89 da Lei nº8.666/93 exige dolo específico e efetivo dano ao erário.

Com isso, não há como fugir ao entendimento de que o crime previsto no art.89 da Lei nº8.666/93 exige dolo específico e efetivo dano ao erário.

A título de conclusão, no presente caso, induvidoso que o réu, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal, numa espécie de arrependimento eficaz, revogou todo o procedimento antes que o mesmo pudesse ser finalizado com a assinatura do contrato administrativo, ‘eliminando’, desta forma, a intenção inicialmente criminosa de produzir prejuízo aos cofres públicos, tanto que, efetivamente, com essa conduta (arrependimento eficaz / revogação do procedimento licitatório) evitou prejuízos ao erário, razão pela qual deve ser absolvido do delito previsto no art.89 da Lei nº8.666/93.

No entanto, deverá ser responsabilizado pelos atos consumados de falsificação de documentos praticados anteriormente, vale dizer, de toda a documentação anteriormente ‘fabricada’ visando fraudar o certame, como abaixo se demonstrará.

Ora, conforme todo o apurado nos autos, prova documental que demonstra a materialidade delitiva, acima mencionada, e pela prova oral produzida diante do contraditório, ampla defesa e devido processo legal, nenhuma dúvida de que foi o réu quem fabricou toda a documentação do procedimento licitatório, responsabilidade essa que seria dos membros da Comissão de Licitação, e não dele.

Importante considerar, já de início, que os próprios membros da Comissão de Licitação, assim que tomaram conhecimento do processo que objetivava licitar prestação de serviço objetivando reformas na sede da Câmara Municipal de São Lourenço, reuniram-se e elaboraram ata deixando claro não terem participado de qualquer fase do procedimento ou processo licitatório, esclarecendo, além disso, que receberam o processo pronto, apenas para ser assinado, das mãos do réu (Cf.f.12).

O conteúdo dessa ata foi confirmado em juízo pelos membros da Comissão de Licitação e depoimentos de testemunhas (Cf.fls.224/234, 277/278 e 288), que de forma uníssona afirmaram, categoricamente, não terem participado de qualquer ato do procedimento.

Como é cediço, e foi inclusive ressaltado pela testemunha Renato - que atualmente é membro da Comissão de Licitações da Câmara Municipal de São Lourenço –, todo o processo de licitação é de responsabilidade da Comissão, sendo que ao Presidente da Câmara cabe, tão-somente, autorizar o início do procedimento, não tendo qualquer participação nos atos administrativos praticados daquele momento em diante.

Veja que da documentação apresentada pelo Ministério Público, de fato, não consta a assinatura de qualquer dos membros da Comissão de Licitação, sendo que o único que assinou documentos nesse processo foi, exatamente, o Presidente da Câmara, ora réu, que à época era o acusado L.C.S.

Portanto, se toda a documentação referente ao processo licitatório não foi produzida pela Comissão de Licitação, só pode ter sido fabricada por quem apôs assinatura nesse procedimento, conforme exposto acima, vale dizer, o acusado.

Nesse passo, estabelece o art. 297 do CP:
Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.

Esse delito possui duas condutas especialmente previstas: a) falsificar, no todo ou em parte, documento público; b) alterar documento público verdadeiro.

O acusado, por certo, incorreu na primeira hipótese, já que, comprovadamente, fabricou e assinou os documentos que seriam de responsabilidade da Comissão de Licitação, sendo a sua condenação, nesse caso, de rigor.

Importante acrescentar, nesse momento, que a falsificação de todo o procedimento (produção, montagem e assinaturas) teve como único objetivo fraudar a licitação, em outras palavras, trapacear o certame, como consta da exordial acusatória e restou devidamente comprovado nos autos pela prova reunida. Fundamental aduzir, por oportuno, que o réu, orientado ou não, acabou sendo astuto e, na posição hierárquica de Presidente da Câmara Municipal, revogou todo o processo assim que percebeu que a fraude poderia ser descoberta e denunciada pelos funcionários que compunham a Comissão de Licitação às autoridades competentes, o que de fato ocorreu.

Somente por isso o acusado se livrou da condenação referente ao crime previsto no art.89 da Lei nº8.666/93, todavia, tal ardil, não serviu para afastar o crime de falsidade documental, que restou devidamente comprovado e consumado, especialmente produzido para fraudar o certame licitatório.

Tais circunstâncias, anote-se, deverão ser examinadas no momento da dosimetria da pena, à luz do art.59 do Código Penal.

A combatente DD Defesa pugna pela absolvição, ao argumento, aqui resumido, de falta de materialidade, aduzindo que não foi realizada perícia na documentação falsificada.

Ora, convenhamos, tal tese, evidentemente, não merece guarida.

Veja que o próprio acusado, quando de seu interrogatório de fls.318/320, não negou que a documentação juntada aos autos pelo Ministério Público corresponde ao processo licitatório por elefabricado e constante da exordial.

Então, o próprio réu reconheceu que tais documentos são verdadeiros e oficiais, cuja falsidade, no fundo no fundo, deve-se à alteração da verdade quanto à autoria. Ele fabricou os documentos e tentou imputar tal autoria à Comissão de Licitação, que a rejeitou pois neste procedimento nunca trabalhou.

A falsidade, nesse processo, como explicado acima, se materializou no ato de fabricar a documentação do procedimento licitatório, o que era da competência da Comissão de Licitação e não do réu. Se os membros da Comissão de Licitação não produziram tais documentos e neles estão apostas diversas assinaturas do acusado, nenhuma dúvida de que ele foi, de fato, o responsável pelo falso.

Continuando a rebater a tese da DD Defesa, noutro aspecto, há ampla jurisprudência a referendar que a perícia pode ser substituída pela prova testemunhal.

Nesse sentido já decidiu o TJMG:

APELAÇÃO CRIMINAL - USO DE DOCUMENTO FALSO - CONDENAÇÃO - NECESSIDADE - MATERIALIDADE COMPROVADA - SUBMISSÃO DO DOCUMENTO À PERÍCIA TÉCNICA - PRESCINDIBILIDADE - COMPROVAÇÃO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. A materialidade do delito previsto nos artigos 304 c/c 297, ambos do Código Penal, não prescinde da submissão do documento ao exame pericial, podendo a sua eventual falsidade ser comprovada por outros meios de prova. (Apelação Criminal 1.0024.09.742218-2/001, Rel. Des.(a) Eduardo Machado, 5ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 07/02/2012, publicação da súmula em 23/02/2012).

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. 1- Nos termos do art. 167 do Código de Processo Penal, "não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta". No entanto, sabe-se que na sistemática processual penal não há qualquer tipo de hierarquia entre as provas, não havendo, pois, restrição quanto àquela capaz de suprir a ausência do exame pericial. Sendo assim, as inúmeras provas documentais acostadas aos autos se mostram mais do que suficientes para se comprovar a materialidade delitiva. 2- Recurso provido, declarando extinta a punibilidade pela ocorrência da prescrição. (Apelação Criminal 1.0024.08.269421-7/001, Rel. Des. Antônio Armando dos Anjos, 3ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 14/08/2012, publicação da súmula em 21/08/2012).

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - USO DE DOCUMENTO FALSO - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PROVA PERICIAL - PRESCINDIBILIDADE - ERRO DE TIPO - NÃO COMPROVAÇÃO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. O delito previsto no art. 304, do Código Penal, por ser de natureza formal, independe da ocorrência de resultado lesivo, bastando a simples utilização do documento dito falso para que o crime se configure. Mostra-se prescindível a produção de prova pericial se a falsidade do documento está comprovada de forma suficiente por outros meios de prova. Não comprovado o alegado erro de tipo, afasta-se a pretensão absolutória. Recurso a que se nega provimento. (Apelação Criminal 1.0024.11.042817-4/001, Rel. Des. Silas Vieira, 1ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 28/08/2012, publicação da súmula em 12/09/2012).

Esse entendimento também é adotado pelo Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS. PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. CONDENAÇÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA AÇÃO PENAL ANTE A FALTA DE LAUDO PERICIAL. DISPENSÁVEL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS POR OUTROS MEIOS DE PROVA. CRIME INSTANTÂNEO QUE SE CONSUMA COM O USO DO DOCUMENTO FALSO. APLICAÇÃO DO ART. 182 DO CPP. ORDEM DENEGADA. 1. No crime de uso de documento falso a prova pericial pode ser dispensada, quando o acervo probatório mostrar-se suficiente para revelar a existência do crime e sua autoria e firmar o convencimento do magistrado. 2. A ausência do laudo pericial não afasta o crime de uso de documento falso, que se consuma com a simples utilização de documentos comprovadamente falsos, data a sua natureza de delito formal. 3. Ordem denegada. (STJ - HC 112895 / MG; Relatora Ministra LAURITA VAZ; QUINTA TURMA; julgado em 16/11/2010; DJe 06/12/2010).

Por fim, a questão relacionada ao alegado “litígio” do réu com seus funcionários, que acabaram perdendo regalias durante sua gestão, mostradas por um rol de documentos juntados às fls.391/515, por ocasião das alegações finais, não tem o condão de colocar em dúvida depoimentos prestados em juízo, diante do contraditório, ampla defesa e devido processo legal, tanto que o nobre causídico, podendo, contraditou, de forma inoportuna, apenas um deles durante a produção da prova oral. Agora, vencida a fase própria, vir querer diminuir valor probante de depoimentos de testemunhas apenas porque o réu, quando Presidente da Câmara, cortou-lhes uma série de regalias, convenhamos, não convence, frisando-se que não existe nenhuma prova nos autos dando conta da alegada “retaliação” por parte dos servidores.

Destarte, não havendo causas que excluam a tipicidade, ilicitude ou a culpabilidade, a condenação no delito do art. 297, § 1º, do Código Penal é de rigor.

Passo à dosimetria da pena, na forma da lei.

Para fixação da pena-base, nos termos do artigo 59 do Código Penal, observa-se o seguinte:

a) A Culpabilidade ressoa grave, pois, de forma consciente, o acusado, como homem público e representante do povo que o elegeu, ao invés de bem cumprir o mandato e dar bom exemplo, mormente no cumprimento das leis, leis que ele também edita, houve por bem de falsificar documentos públicos durante processo licitatório, e o fez de forma desonesta, clandestina, fraudulenta, o que agrava a culpa e aumenta o grau de reprovabilidade da conduta. Veja que o réu agiu com consciência potencial de ilicitude, quando dele se esperava comportamento diverso. Para consecução de seus objetivos ilícitos, valeu-se da sua posição de mando e proeminência, destacando-se o fato de Presidir a Câmara Municipal, chefe do Poder Legislativo do Município de São Lourenço. Essa posição de força foi fundamental para o ilícito praticado, sendo, pois, extremamente elevada a culpabilidade (juízo de censura);
b) Os Antecedentes, em que pese constar de sua CAC (fls.358/360) diversas anotações relatando práticas de infrações penais, até mesmo estelionato, onde acabou aceitando suspensão do processo por 2 anos, extinguindo-se, posteriormente, a punibilidade, por força da Súmula 444 do STJ de nenhuma valia tal vida pregressa maculada para efeitos de agravamento da pena nesta fase inicial,
c) Sem elementos nos autos para perfeita análise da Conduta Social do acusado, esta que simboliza o seu papel em sociedade, retratando-o no trabalho, na família, na comunidade etc. Contudo, uma observação deve ser feita, qual seja, a conduta do réu em praticar o delito na condição de Presidente da Câmara, deve pesar, mesmo que minimamente, na dosimetria, visto que, como ponderado supra, a conduta social simboliza o papel do indivíduo em sociedade, bem como retratando-o no trabalho. E o que o réu fez durante o trabalho e por conta do trabalho? – Falsificou documentos para fraudar licitação. Conduta bastante reprovável, evidentemente.
d) Quanto à Personalidade, inexistem elementos nos autos que permitam avaliar adequadamente essa circunstância judicial, um dos principais fatores de individualização da pena. É verdade que a CAC de fls.358/360 mostra parcela de sua índole, já tendo se envolvido em crime de estelionato.
d) Os Motivos que o levaram a falsificar documentos públicos estão relacionados com a intenção de fraudar uma licitação em benefício próprio e de terceiros (S & L Consultoria, Administração e Atividades Educacionais Ltda), circunstância absolutamente reprovável para um Vereador, e mais, para o Presidente da Câmara Municipal;
e) As Circunstâncias em que o delito foi praticado são, em tudo, desfavoráveis, tendo o réu agido de forma descabida, mormente como Chefe do Poder Legislativo local, de quem não se esperava tal conduta, dando péssimo exemplo aos concidadãos, tomando decisões com relação aos bens e interesses públicos em busca de benefícios pessoais e de terceiros (S & L Consultoria, Administração e Atividades Educacionais Ltda) em prejuízo da comunidade que o elegeu. Acrescente-se que o cargo ocupado por ele, e os engenhos utilizados, são circunstâncias adversas a ensejar a majoração da reprimenda. São circunstâncias residuais e aqui bem cabe inserir todas as considerações específicas encontradas nas provas produzidas que não possam ser incluídas noutros fatores.

Em assim sendo, e observadas as diretrizes do art.68 do Código Penal, como algumas das circunstancias judiciais são desfavoráveis ao réu, justifica-se a fixação da pena base um pouco acima do mínimo legal, que é de 2 anos reclusão (CP, art.297).

Fixa-se, pois, neste momento, como necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, pena base igual a 03 anos de reclusão, um pouco acima do mínimo legal (2 anos), mas bem aquém do máximo (6 anos), além de 15 dias multa (superior a 10 dias multa), no valor unitário mínimo.

Ausentes atenuantes.

Presente a agravante prevista no art. 61, II, “g” do CP, uma vez que o réu praticou o falso com abuso de poder inerente ao cargo de Presidente da Câmara Municipal de São Lourenço, violando a confiança que se deposita em quem exerce cargo eletivo, como o dele, motivo pelo qual exaspero a reprimenda em mais 1/6, totalizando, agora, 03 anos e 06 meses de reclusão e 17 dias-multa, no valor unitário mínimo.
Ausentes causas especiais de diminuição de pena.

Presente, por fim, a causa especial de aumento de pena prevista no §1º do art.297 do CP, uma vez que o réu praticou o crime prevalecendo-se do cargo público que ocupava. Tal se justifica porque, sendo o réu, à época dos fatos, Vereador e Presidente da Câmara Municipal de São Lourenço, perfeitamente natural que sua conduta tenha mais desvalor, impondo-se, dessa forma, maior rigor punitivo. Considerando tais circunstâncias, procedo ao aumento de mais 1/6 na pena, totalizando, definitivamente, 04 anos e 01 mês de reclusão, além de 19 dias-multa, mantido o valor unitário mínimo.

O réu cumprirá a pena privativa de liberdade que lhe foi aplicada no regime inicial semiaberto de prisão (CP, art.33, §2º “c” e §3º).

PELO EXPOSTO, e considerando tudo o mais que dos autos consta, julgo parcialmente procedente a denúncia para o fim de:

a) CONDENAR L.C.S., qualificado nos autos, a cumprir pena privativa de liberdade de 04 anos e 01 mês de reclusão, no regime semiaberto de prisão, e a pagar 19 dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, atualizado, quando da execução, pelos índices da correção monetária, por infração ao art.297, § 1º, do CP.

b) ABSOLVER L.C.S, qualificado nos autos, da imputação de infração ao art.89 da Lei n°8.666/93, e o faço com fundamento no art.386, inciso III, do Código de Processo Penal.

Como efeito da condenação, nos termos do artigo 92, I, “a” do Código Penal, decreto a PERDA DO CARGO E DO MANDATO ELETIVO ocupado pelo réu, qual seja, de vereador do Município de São Lourenço.

Confira a legislação citada:
Código Penal - Art. 92 - São também efeitos da condenação:
I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: (Inciso com redação dada pela Lei nº 9.268, de 1º de abril de 1996 - DOU 02.04.96).
a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;

Tal sanção se justifica porque o réu, ao falsificar documentos públicos visando fraudar licitação, o que fez intencionalmente, como visto supra, vale frisar, com vontade de trapacear o certame, ele, ocupante de cargo público importante, já que legislador municipal, editor de regras que devem ser cumpridas por toda a sociedade, com a agravante de ocupar o honrado posto de Presidente da Câmara Municipal de São Lourenço, obrou, induvidosamente, ilegalmente e com abuso de poder, violando deveres para com a Administração Pública e em desrespeito aos concidadãos que o elegeram para tão nobre missão, quebrando-lhes a confiança, indignando-os, rematando com isso, lamentavelmente, por demonstrar desprezo e menoscabo a princípios que regem a coisa pública, com destaque para o da moralidade, da legalidade, finalidade e o da impessoalidade, a justificar, sem dúvida nenhuma, a perda do cargo.

A DD Defesa sustenta que para a aplicação do art.92 do Código Penal, faz-se necessário o preenchimento de dois fatores: a) o dano causado; b) as condições pessoais do acusado.

Ora, quanto à natureza e extensão do dano causado, há que se ressaltar que o réu, ao perceber que sua fraude já era do conhecimento do Ministério Público e que, com certeza, responderia a uma ação penal, muito astutamente, revogou o processo administrativo de dispensa de licitação que estava em curso (f.119), e convenhamos, ninguém pode se beneficiar de sua própria torpeza, daí a extensão do dano, que houve, embora mínimo, não poderá beneficiá-lo neste momento. Pondere-se que houve um prejuízo moral para a Casa Legislativa como um todo, além de prejuízo material, aqui não computado, mas evidenciado com a produção de todos os documentos falsos que acabou ensejando a condenação.

Com relação às condições pessoais do acusado, da análise das circunstâncias judiciais extrai-se culpabilidade elevada, com alto grau de reprovabilidade da conduta (juízo de censura); conduta social inadequada, com destaque para os atos ilícitos praticados no trabalho; praticas delitivas anteriores (CAC, fls.358/360), em que pese não gerar reincidência nem maus antecedentes, mas que não deixam de macular a vida pregressa; e, finalmente, motivos e circunstâncias do crime absolutamente desfavoráveis ao acusado.

Eis razões e justificativas mais do que suficientes para embasar a perda do cargo e do mandato.

Anote-se, outrossim, que incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, uma vez que a pena aplicada foi de 04 anos e 01 mês de reclusão (CP, art. 44, I).

Pelo mesmo motivo, incabível o sursis (CP, art.77)

Declaro a suspensão dos direitos políticos do réu, na forma do art.15, inciso III, da Constituição Federal.

Transitada em julgado esta sentença, preencha-se o CDJ, encaminhando-se ao órgão competente e à Justiça Eleitoral para as providências do art.15, III, da Carta da República, conforme Aviso nº 35/CCJ/2012; expeça-se Guia de Recolhimento para formação dos Autos de Execução Penal e seus devidos fins (LEP, arts.105/106).

Condeno o réu nas custas do processo, na forma da lei.

P.R.I.C.

São Lourenço, 28 de março de 2.016.


Fábio Garcia Macedo Filho
Juiz de Direito da Vara Criminal



* A decisão é de 1ª Instância e cabe recurso